terça-feira, 27 de setembro de 2011

Antônio de Araújo - revista MODO 18


Trecho de entrevista concedida à revista MODO 18, de 04 de junho de 2008. Reporte: Hermes Coimbra



MODO 18 - Como você iniciou sua pesquisa nas artes plásticas?

ANTONIO DE ARAUJO - Fui motivado a me dedicar às artes visuais em 1994 quando, numa estada em Belo Horizonte, conheci a obra de Fernando Cardoso. A primeira impressão que tive foi de estar tendo contato com um diário visual - um registro muito sofisticado do universo do artista. As questões propostas por Fernando eram ao mesmo tempo mínimas e cheias de simbolismo. Fiquei muito impressionado. Antes meu entendimento sobre arte era ligado exclusivamente à forma. E eu jamais havia pensado na possibilidade de enxergar o conceito como algo capaz de comunicar uma visão de mundo ou um comportamento. Eu possuía uma visão limitada da arte, mesmo tendo contato com muitas obras contemporâneas. Em 1996 abandonei o curso de medicina e ingressei na Escola de Belas Artes da UFMG.

M. 18 - Você sempre cita Fernando Cardoso. Como a obra deste artista pode ser observada em seus desenhos?

A. A - Sem escrúpulos digo que até 1999/2000 meu trabalho pode ser uma interpretação da obra dele. Depois incorporei vários outros nomes, mas de modo mais diluído. Muitos artistas sentem-se incomodados em assumir certas influências. Orgulho-me muito das minhas.

M. 18 - Quais outros nomes citaria como influências para seu trabalho?

A. A - Acredito que um trabalho sério de arte segue uma tradição lógica. Sei que esta afirmação pode parecer extremamente conservadora, mas não é. Esta tradição não está somente presente na elaboração de uma pesquisa individual, mas é identificada nas obras de toda uma geração. Portanto sinto-me influenciado direta e indiretamente por todos artistas e objetos de arte produzidos. Artistas que tive muito contato, tenho muito carinho e sempre consultei para crítica do meu trabalho foram, entre outros: Amílcar de Castro, Roberto Bethônico, Luiz Flávio Silva e Carin Bergman.

M. 18 - De certa forma, você diria que sua obra foi bastante influenciada por uma geração da década de 90?

A. A - Totalmente. Dos anos noventa podemos perceber claramente uma estética própria, intimista e com referências de obras conhecidas.  Houve uma tietagem em cima de grandes artistas e uma imediata releitura da obra dos mesmos. Na verdade foi uma época que escutávamos a palavra releitura em todos os diálogos sobre arte.

M. 18 - Alguns de seus últimos trabalhos tendem à negação do próprio valor da arte, enquanto trabalhos anteriores reafirmam este valor. Para quem acompanha sua carreira e conhece um pouco de sua vida pessoal, é inevitável não relacionar uma grande mudança após o acidente que você sofreu. Isso se justifica?

A. A - O acidente que sofri foi decisivo para as mudanças que ocorreram no meu trabalho. Apesar destas estas mudanças já estarem previstas bem antes, como forma paralela ao desenho. A coleção que tive acesso em Dublin de arte oriental fermentou em algumas escolhas que fiz hoje, e o acidente me proporcionou um período de recesso, onde pude analisar melhor questões muito pertinentes ao meu trabalho e atitudes frente às experiências que eu havia procurado antes não enfrentar.

M. 18 - Muitas vezes seu trabalho foi exposto de forma pouco convencional. O tema homoerotico, representado de forma explícita, e inserido em espaços públicos, agora é mostrado de forma velada, mas ainda ocupando espaços inusitados. Qual a causa desta forma de exposição?

A. A - Não há um planejamento para a forma de apresentação do trabalho. Por mais que as imagens tendam para uma apresentação mais intimista, busco também uma interação com o espaço. Mantenho uma constante vigilância para que a obra não fique vinculada a uma determinada visualidade. O trabalho não pode ficar preso, ou talvez possa, mas eu evito que isto aconteça.  Esta proposta em querer surpreender, hoje, já está ficando mal vista, mas esse processo é feito exclusivamente para mim.